Foi o nosso primeiro filme em conjunto, meu, do Tiago, da Patrícia, do Miguel, do João, e de outros tantos mais. Não foi o primeiro filme de ninguém individualmente, mas como num relacionamento, cada filme é um filme e é sempre o primeiro quando a equipa é outra. Idealmente, gostava de repetir as mesmas 19 pesssoas envolvidas e fazer assim um segundo filme.
Até lá, este primeiro faz o seu caminho. Em Abril, a ante-estreia incrível (deu vontade de fazer mais filmes só para fazer mais festas assim) e a estreia na nossa pérola do atlântico. Mais tarde, exibição no Shortcutz Lisboa e estreia internacional no famigerado Festival Internacional de Huesca. Até aqui, tudo maravilhoso. Mas felizmente, ficámos a saber que não terminou por aqui. Cada selecção oficial para um festival é motivo de celebração, quais adolescentes numa festa de aniversário. Desta vez, no Festival de Cinema de Avanca.
Nunca te visitei, Madeira, mas já gosto tanto de ti.
Não sei se é este abismo hipnotizante das fotografias pelas quais vagueio no Google, se é do nevoeiro que parece pousado de propósito para o quadro.
Eu tenho vertigens e anseio subir-te, ignorar a tontura e o enjoo, encostar-me a uma montanha e olhar-te de frente, sentir o ar rarefeito do topo do Pico e, bom, e se realmente corresponderes à expectativa, sorrir.
Só falta uma semana para pisar-te. Saberás tão bem quanto eu como correu, se esse será o primeiro de muitos dias, se será a primeira de muitas viagens.
Não sei se é deste verde que te emoldura, Madeira, bonita, não sei se é por saber que após tantas montanhas e tanto nevoeiro vou conseguir ver o teu mar.
E, claro, aceito dicas para a viagem e truques úteis. Vou estar no Madeira Film Festival (com o Vícios Para Uma Família Feliz) todos os dias e, tenho a certeza, bastante e muito bem ocupada. Mas e coisas como: mosquitos, temperatura e etc? Transportes? Contactos importantes dos que não se encontram na internet? Agradeço!
A prova de que em pouco tempo se conseguem criar grandes emoções. - Fernando Fragata
Bela, cruel e hipnótica, “Vícios para uma família feliz” é a ficção da pior realidade que todos escondemos sobre nós próprios. - Nuno Duarte
Terminou em Março. Daqui a duas semanas rumamos à Madeira para a estreia oficial. Em Maio estará, sozinho, em Cannes.
O nome "Vícios Para Uma Família Feliz" esteve dois anos e meio nas nossas cabeças; saiu das nossas mãos e do nosso sangue. (ler mais sobre o processo aqui)
E desde sexta-feira, dia 8 de Abril, que ele tem a sua própria vida e já não nos pertence só a nós.
A ante-estreia à porta fechada (um filme em circuito de festivais não pode ser exibido publicamente) foi, com todo o carinho, alimentada pelo Pito do Bairro, do Olivier e acolhida no maravilhoso Cargo 111, no Bairro Alto, em Lisboa.
A todos os presentes, a todos os que morreram um pouquinho por não terem conseguido estar presentes, a todos que me perguntam quando posso ver, quando posso ver:
Voltei definitivamente de São Paulo, instalei-me em Lisboa e liguei ao Tiago. E se fizéssemos alguma coisa os dois? Tu escreves, eu interpreto, já está. OK. Ainda bem, vou ligar a um amigo meu que de certeza que também vai gostar da ideia. O Eurico gostou da ideia. Ganhámos o concurso para ficar na sala 3 do Teatro Rápido, no Chiado. Entre o telefonema e a estreia passaram-se uns singelos dois meses.
Tivémos uma estreia fantástica aos olhos de todos, o que não costuma ser grande agoiro na prática teatral. Eu, arrasada por um drama pessoal que se me caíra no colo quatro minutos antes da entrada em cena, fiz a peça com a maior adrenalina de todo o mês. Usa isso, disse o Tiago. E diz-se muito, usa isso a teu favor. Hoje estou profundamente grata por esse infortúnio. Mudou todo o curso da minha história, para melhor. Usei isso para estreia e para a vida.
Dois anos depois, ainda à espera de sermos pagos pelo Teatro Rápido/Encena/Alexandre Gonçalves, decidimos investir outra vez o nosso tempo sem expectativa de retorno. No sábado em que gravámos "Vícios Para Uma Família Feliz" - o filme - senti a adrenalina fluir e arrepiar-me o pescoço, numa felicidade pura pelo que estávamos a fazer, num prazer genuíno em conhecer todas aquelas pessoas que quiseram amar este filme connosco. Foi um dia de amor. Acabámos a comer migas do pingo doce e a beber minis da bomba de gasolina mais próxima.
Março de 2016, o filme é exportado e as lágrimas sobem. Sem ainda ter tido um dia para apresentá-lo à equipa, já recebi duas boas notícias: Short Film Corner do Festival de Cannes, Selecção Oficial do Madeira Film Festival.
Um dia perguntaram-me: e se não houvesse dinheiro no planeta e pudesses fazer qualquer coisa, o que farias ou o que serias?